I. Manifesto: apresentação e compromisso

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                                                                                                       Luanda, 08.04.2012                                                      

Ass.: apresentação e compromisso

Caros Colegas:

         A eleição é uma escolha – no caso, de advogados por advogados.

         A equação duma eleição na OAA tem como variantes principais as listas candidatas (elencos elegíveis) e o respectivo programa de acção.

           É de esperar que cada candidato, a começar pelo cabeça-de-lista, seja avaliado pelo seu perfil conhecido, neste incluídos o sentido de missão e o potencial de vontade de cumprir de facto o programa e prosseguir de facto os fins estatutários, e que o programa de acção de cada candidatura seja avaliado pelas virtudes que contenha (sintonia diagnose-terapia, sinergia virtual, completude, modernidade, pragmatismo e factibilidade).

            O que recomenda a presente candidatura são as suas diferenças. O pano de fundo dessas diferenças está em que ela não é uma candidatura mais, muito menos uma candidatura de mais – é, seguramente, uma candidatura para mais.

         A primeira diferença está no próprio parto da candidatura. Ela não nasceu, obviamente, por geração espontânea. Também não nasceu duma vaga de fundo e, muito menos, duma crista de onda montada por uma coligação estratégica de escritórios ou por um clube guardião auto-assumido. Nasceu, simplesmente, da sedimentação de reflexões, opiniões e trocas de impressões, acumulada quase desde os primórdios da OAA, realçada diacronicamente nos períodos de véspera dos últimos triénios eleitorais, no decurso de conversas casuais, das quais o signatário no mais das vezes esteve ausente, entre Colegas notáveis, de diversas tendências, saberes e sensibilidades, preocupados com o futuro rumo da Ordem.

O nome do signatário emergiu ultimamente a cada três anos. A resposta foi sempre de recusa, até que, desta vez, instado por Colegas de vários quadrantes e camadas, inclusive ex-dirigentes da OAA, cujo peso profissional e ético é uma referência inarredável, o signatário respondeu à chamada.

Respondeu confrontado com um conjunto de factores, entre os quais a apatia e abulia da massa associativa denunciada pelos próprios dirigentes da Ordem, a actual indisponibilidade de personalidades de prestígio da Ordem para encabeçarem candidaturas e a apelativa abertura da conjuntura jusconstitucional e institucional de momento à afirmação da autonomia da Ordem, em todas as vertentes úteis.

         Outra diferença desta candidatura está na sua própria natureza. Trata-se duma candidatura da Ordem, para a Ordem e pela Ordem. Não quer somente cortar com o estilo de gerir a Ordem ― quer romper com o próprio quadro mental que, de dentro e de fora, amarra a Ordem. Não quer ficar-se por reformas cosméticas ― quer reformas de fundo, realistas e criativas, inspiradas na realidade nacional, afro-regional, lusófona e internacional, que, sem comprometerem as reservas morais da Ordem, respondam a contento às inquietações, anseios e necessidades da classe, quer enquanto voltada para os seus problemas internos, quer enquanto identificada com os interesses dos utentes da Justiça e com a causa do Direito urbi et orbe.

         Outra diferença marcante desta candidatura está no facto de, no seu conjunto, ser independente, quer no plano político, quer nos demais. Desde logo, é transversal em relação às formações político-partidárias do País, não se identificando com nenhuma delas. Também é estranha a qualquer fenómeno de delfinismo ou para-delfinismo vindo de dentro ou de fora da Ordem. Na verdade, não tem cabeça-de-lista algum, ou candidato sequer, que exerça actualmente, ou tenha exercido em mandato antecedente, a presidência ou vice-presidência de qualquer órgão social ou comissão da Ordem. Importante ainda, neste ângulo, é que esta candidatura é alheia a qualquer patrocínio ou recomendação vinda dum clube ou grupo guardião da Ordem – é, sim, feita de advogados que não fazem nem fizeram carreira dentro da Ordem e que não vêem no exercício dos cargos a que se candidatam uma catapulta para cargos, mordomias ou benesses dentro do aparelho de Estado ou entidades afins. Sintomaticamente, a maior parte dos candidatos das 2 listas aliadamente integrantes desta candidatura não tem filiação nem ligação afim a qualquer partido; os restantes são talvez, na maioria, ligados ao partido no Poder, mas isso por mero acaso, sem que tal ligação comprometa a isenção da candidatura.

         A OAA não deve fazer política e deve não fazer política, de modo a não se  comprometer politicamente seja com que força for. Isto não quer dizer, evidentemente, que não deva ser procurada a colaboração máxima entre a OAA e o Ministério da Justiça, os CSM, a PGR, a Provedoria de Justiça, o Ministério do Interior e, em geral, o Executivo e demais órgãos de soberania. A autonomia da OAA, se cumprida como deve ser, promete, mesmo, uma colaboração mais profícua do que o “status” tido e mantido de défice de autonomia de facto.

         Esta isenção assegura a consentaneidade desta candidatura com o princípio da autonomia institucional da Ordem. A OAA tem hoje assento jusconstitucional, não só como “associação de profissionais liberais” […] regida pelo “princípio da independência em relação ao Estado” (art. 42.º, n.º 2, da CRA), mas também com a categoria de “instituição essencial à Justiça” (epígrafe dos arts. 193.º a 195.º da Constituição da República de 2010), que abrange a sua qualificação como autarquia institucional não tutelada. A OAA, como manda hoje o legislador constitucional, não está sujeita à tutela do Executivo, nem a qualquer outra tutela dos órgãos do Estado ou de força alguma político-partidária. Por maioria de razão, ao abrigo do mesmo princípio da autonomia institucional, o processo eleitoral, que conduz à escolha dos órgãos da OAA, tem de ser livre e independente de qualquer grupo de pressão, formado ou não dentro da OAA, que possa, directa ou indirectamente, influir nos resultados das urnas. Este princípio conjuga-se, aliás, com a tutela jurisdicional efectiva consagrada como garantia jusconstitucional no art. 29.º, n.º 1, da CRA (“A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para a defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos […]”).

         Outra diferença está no programa e no elenco das listas da candidatura.

         O programa é, folgadamente, o mais abrangente e profundo de todos os apresentados até à presente eleição. Aborda, em grande parte, problemas novos e aponta soluções ou caminhos, plausíveis ou alternativos, para tais problemas.

Com este programa, quebrou-se a tradição do programa perfunctório, feito para não ser lido.

         Os candidatos foram seleccionados quando possível à lupa, principalmente, segundo um critério de probidade moral e intelectual. Foram evitadas candidaturas de advogados com passado manchado no cadastro da Ordem ou inquinado pelos meios de comunicação social. Seguiram-se os critérios da sensatez, mundividência e maturidade deontológica e técnico-jurídica.

         Dos 9 candidatos a membros efectivos do Conselho Nacional, 5, feita a soma, têm mais do dobro da antiguidade profissional de outros tantos candidatos de qualquer outra lista até hoje alguma vez apresentada para esse órgão (quase 150 anos ao todo, quase 30 em média por cabeça). Três deles têm experiência pluricontinental de operadores judiciários estabelecidos e um deles tem essa experiência em 3 Países da Lusofonia de 3 continentes. Dois deles têm experiência de operadores da Magistratura Judicial e do M.º P.º em Angola.

         Esta experiência diatópica (transnacional), também diacrónica (transgeracional) e diastrática (de plúrimas camadas do saber jurídico), é um tesouro de conhecimentos e inventividade, que, rendibilizado, se presta a frutificar optimamente quanto às reformas de que carece a Ordem.

O candidato a Presidente do CPL tem, segundo patenteia, um currículo objectivamente mais recheado do que qualquer candidato cabeça-de-lista em eleições anteriores. Com a advocacia, acumula o passado de docência universitária e o presente-futuro de formação académica.

De um modo geral, todos os candidatos estão fortemente entrosados com a advocacia e foram escolhidos segundo critérios de rigor ético e profissional.

Esta candidatura quer, afinal, a reforma do modo de ser e de estar da OAA dentro e fora da Justiça. Quer, acima de tudo, a reforma das mentalidades (a começar pela ideia-força de que nenhum membro da Ordem é dispensado de ter nela um papel interventivo). Esta candidatura foi decidida, projectada e estruturada na perspectiva de tais reformas.

A nossa candidatura tem, naturalmente, prioridades. Não está preocupada com o advogado instalado. Diversamente, prioriza, do programa, os problemas do advogado em princípio de carreira, que todos fomos já e alguns ainda somos, e os problemas do advogado em fim de carreira, que todos seremos e alguns somos já.

Os nossos candidatos não são iluminados, mas não andam de candeia nas trevas à procura de ideias e projectos. Julgam ser capazes, se eleitos, de estimular a participatividade activa e inventiva dos Colegas, para mais eficazmente darem remédio aos problemas da Ordem. Mas, acima de tudo, os candidatos são advogados, que não querem interromper a advocacia e, muito menos, abandoná-la fazendo da Ordem um palco ou rampa de lançamento virada para o que quer que seja fora da advocacia. Esta faceta é sentidamente emblemática porque ligada à própria razão de ser da candidatura.

Este programa foi feito mesmo para ser lido. Não é panaceia mas também não é placebo. Não foi feito com espírito carreirista, mas também não nasceu da diletância. Finalmente, não foi feito por uma elite distanciada da vivência do eleitorado. Foi feito, isso sim, por quem, no dia-a-dia, viveu e sentiu na pele os mesmos problemas dos colegas eleitores.

A Ordem tem de sair da naftalina, antes que a metam no formol. Tem de passar da menoridade, que é o constrangimento exógeno tornado endógeno por inércia, à maioridade, que é a autonomia institucional.

No final, escrutinadas as urnas, não haverá, na essência, uma candidatura vencedora e uma candidatura vencida. Haverá, isso sim, em prospectiva, uma Ordem vencedora ou uma Ordem vencida. Desta qualificação de vencimento não será árbitro qualquer dos cabeças-de-lista. O único ajuizador será o tempo, filtrado ao longo do triénio subsequente ao próximo escrutínio, se bem que falte ao ajuizamento o termo de comparação do contraposto desempenho.

Esta candidatura tem, para já, pelo menos um mérito patente – quebrou o ciclo das listas únicas, ultimamente ditas de consenso. Tal quebra de ciclo é a única vitória de que esta candidatura pode estar certa.

O voto que fazem os membros desta candidatura é de que esse ciclo não se interrompa, de que nunca mais haja na Ordem uma lista única candidata aos seus corpos sociais. Por essa via, a autonomia da Ordem estará sempre assegurada. E, assegurada que esteja a autonomia da Ordem, assegurado fica o papel da Ordem na casa da Justiça do Estado de Direito democrático.



         Com os cumprimentos de colega para Colegas,



Miguel Faria de Bastos